REDES- Revista hispana para el análisis de redes sociales
Vol.16,#9, Junio 2009
http://revista-redes.rediris.es

A Influência da Imersão Institucional e Regional na Cooperação entre Pesquisadores no Brasil

Luciano Rossoni & Alexandre Graeml – Universidade Positivo e Universidade Federal do Paraná (Brasil)[1][2]

Resumo

A análise do campo científico como uma rede social vem ampliando o entendimento das relações entre pesquisadores como atividade social. Além do significado dado pelos relacionamentos entre pares, questões estruturais emergem, fomentando explicações sobre como níveis sociais mais amplos condicionam as relações de co-autoria. Buscando contribuir para essa linha de estudos, o objetivo do presente artigo é analisar como as relações entre pesquisadores da área de administração da informação no Brasil são condicionadas pela imersão institucional e regional. Para tanto, foi utilizado o método da análise de redes sociais, mais especificamente a técnica de generalized blockmodels para testar modelos relacionais de homofilia e centro-periferia. Verificou-se que todos os modelos relacionados ao padrão de homofilia foram significativos e que o condicionamento devido à instituição foi mais homogêneo do que o decorrente das unidades federativas. Diferentemente do esperado, os padrões do tipo centro-periferia mostraram-se pouco significativos. Mas, pautando-se no resultado que foi significativo, verifica-se que existe algum mecanismo de seleção privilegiado por pesquisadores que fazem parte de algumas regiões, seja pelo acesso a recursos e informações, seja pela existência de programas mais tradicionais. Adicionalmente, o estudo aponta para implicações teóricas e práticas, destacando possibilidades de estudos futuros.

Palavras-chave: análise de redes sociais; blockmodels; centro-periferia; ciência; homofilia.

Abstract

The analysis of a scientific field considering it as a social network has broadened the understanding of the relationships among researchers. In addition to the information obtained directly from the relationships among peers, structural issues emerge, providing explanations about how broad social connections condition co-authorship relationships. In an attempt to contribute to this research stream, the objective of this paper is to analyze how the relationships among researchers in the Information Management field in Brazil are conditioned by their working for the same universities or living in the same geographical area. In order to accomplish that, a social networks analysis method was used, more specifically the generalized blockmodels technique, in order to test homophily and core-periphery models. It was found that all homophily models were significant and that the conditioning due to belonging to the same university was stronger than that caused by living in the same area. Differently to what was expected, the core-periphery models proved little significant. Based on the results that were significant, one realizes that there are selection mechanisms that are used by researchers that live in some geographic areas, related to the access to resources and information or the existence of some more traditional postgraduate programs whose professors attract the collaboration of others. The results of the study have important practical and theoretical implications and provide several opportunities for further studies.

Keywords: social network analysis; blockmodels; core-periphery; science; homophily.

Introdução

A atividade científica, como qualquer atividade social de caráter coletivo (Moody, 2004) é condicionada pelos relacionamentos sociais. Pesquisadores não trabalham sozinhos, eles desenvolvem suas pesquisas a partir da cooperação com outros pesquisadores, cuja forma de cooperação mais evidente e comum é a co-autoria (Acedo, Barroso, Casanueva & Galán, 2006). Com efeito, as relações de co-autoria não se encerram nas relações entre pares, mas compreendem uma diversidade de questões estruturais, levando a uma crescente análise da ciência como uma ampla rede social (Acedo et al., 2006; Barabasi et al., 2002; Graeml, Macadar, Guarido Filho & Rossoni, 2008; Li-Chun, Kretschmer, Hanneman & Ze-Yuan, 2006; Liu, Bollen, Nelson & Van de Sompel, 2005; Moody, 2004; Newman, 2001; Otte & Rousseau, 2002; Rossoni & Hocayen-da-Silva, 2008; Wagner & Leydesdorff, 2005). Nessa linha de raciocínio, praticar ciência significa estar imerso em um conjunto de relações em que as repercussões dessas relações não se restringem ao contexto imediato do pesquisador, refletindo relações presentes em outros níveis sociais.

Em face do exposto, o presente artigo busca avançar na análise dos padrões de cooperação entre pesquisadores, tomando como exemplo a área de Administração da Informação do Brasil (ADI), procurando compreender o que a condiciona. Especial ênfase é dada à análise da influência da instituição de ensino e pesquisa a qual o pesquisador está associado e à unidade da federação em que se situa, procurando avaliar sua importância no condicionamento da co-autoria em trabalhos acadêmicos. Ao utilizar uma técnica de análise de redes pouco disseminada – generalized blockmodels – mas com grande poder analítico, os autores foram capazes de identificar padrões de homofilia e de estratificação que se desenham na área de Administração da Informação e que são explicados pela forma como a área se configurou ao longo de sua história no Brasil.

Nas seções seguintes, são apresentados o referencial teórico sobre relações de homofilia e o conceito de centro-periferia, os procedimentos metodológicos adotados no estudo, os resultados obtidos e, por fim, as conclusões do trabalho.

Relações de homofilia e de centro-periferia

Um dos fenômenos mais comumente analisados nas ciências sociais é a homofilia (Hanneman & Riddle, 2005). Homofilia é o princípio de que o contato entre pessoas com características similares ocorre em maior freqüência do que entre pessoas com baixa similaridade (McPhearson, Smith-Lovin & Cook, 2001), podendo ocorrer em qualquer tipo de rede. Seus princípios, apesar de terem sidos delineados inicialmente por filósofos antigos como Aristóteles e Platão, foram pioneiramente discutidos nas ciências sociais por Lazarsfeld e Merton (1954), fundamentados primordialmente no trabalho teórico de Simmel (1950). Diante da maior densidade de relações entre indivíduos com as mesmas características, os autores fizeram uma analogia do agrupamento de indivíduos com a aglomeração de aves, cunhando a famosa expressão que define o fenômeno: ‘birds of a feather flock together’ (pássaros da mesma espécie se aglomeram).

Lazarsfeld e Merton (1954) estabeleceram dois tipos de homofilia: homofilia baseada no status, em que a similaridade é fundamentada na estratificação formal ou informal, e homofilia baseada em valores, pautada na similaridade de crenças, valores e atitudes. A primeira, que é o foco deste estudo, inclui uma ampla variedade de dimensões sociodemográficas como raça, etnia, sexo, idade e características adquiridas como religião, educação, ocupação, classe social e posição na rede (McPhearson, Smith-Lovin & Cook, 2001).

Entre as origens da homofilia, provavelmente a mais básica é o espaço: as pessoas apresentam maior probabilidade de estabelecer contato com outras que estão mais próximas do que com as que estão distantes (McPhearson, Smith-Lovin & Cook, 2001). O motivo básico para que isso ocorra é o menor esforço necessário, pois a energia para contatar alguém próximo é menor do que para contatar alguém distante. Porém, o advento de novas tecnologias, principalmente a Internet, tem diminuído o condicionamento geográfico, embora não tenha sido capaz de eliminar o velho padrão: contatos mediados por computador tendem a ser sustentados por encontros face-a-face (Wellman, 1996); relações entre pesquisadores em diferentes áreas da administração tendem a apresentar maior proporção de laços dentro da mesma unidade da federação (Rossoni, Hocayen-Da-Silva & Ferreira Júnior, 2008a, 2008b; Rossoni & Guarido Filho, 2007).

O vínculo organizacional e institucional também é fonte de homofilia, provendo a grande maioria dos laços que não são de parentesco (Louch, 2000). Por exemplo, o compartilhamento do local de trabalho, de instituições de ensino, de organizações profissionais e de sociedades secretas aumenta as chances de formação de relacionamentos pessoais (Louch, 2000). O mesmo ambiente propicia que os membros de uma dada organização tenham assuntos em comum, tenham menor número de barreiras para a interação, ocasionando em maior freqüência e proximidade. No caso do campo científico, os programas de pós-graduação lotados nas instituições de ensino propiciam que professores e alunos interajam por meio de aulas, reuniões, grupos de pesquisas, entre outras formas, possibilitando em maior grau que relações de co-autoria ocorram. Sendo assim, perante os argumentos sobre homofilia em nível regional e institucional, delineia-se a seguinte proposição:

Proposição 1: A probabilidade de que o pesquisador estabeleça relações dentro da instituição à qual está vinculado e dentro da mesma unidade federativa é maior do que com pesquisadores que não satisfaçam essas condições.

Além da homofilia, algumas redes de relações apresentam um padrão de estratificação do tipo centro-periferia (McPhearson, Smith-Lovin & Cook, 2001). Em termos intuitivos, uma estrutura do tipo centro-periferia remete à idéia de que alguns agrupamentos de uma rede não podem ser divididos em grupos exclusivos, pois apresentam relacionamento com grupos de fora (Borgatti & Everett, 1999). Assim, partindo-se da identificação hipotética de dois grupos, o centro e a periferia, atores no centro estão densamente conectados entre si, enquanto os atores da periferia apresentam maior densidade de laços com os atores do centro do que com seus pares periféricos.

Popularizada por Wallerstein (1974), que analisou a dependência de alguns países frente a divisão internacional do trabalho, a noção de centro-periferia é amplamente discutida em alguns campos do conhecimento, como relações internacionais (Snyder & Kick, 1979), economia (Krugman, 1996) e estudos organizacionais (Faulkner, 1987). Porém, só recentemente ela foi formalizada por Borgatti & Everett (1999). Esses autores estabeleceram dois tipos de modelos centro-periferia, um discreto, com dois grupos, e outro contínuo, em que cada ator recebe um escore na relação, permitindo que o estabelecimento do número de grupos seja mais flexível. Posteriormente, novas aplicações foram implementadas a tais modelos, permitindo que fossem avaliados os padrões de relações do tipo centro-periferia em grupos definidos a priori (Borgatti, Everett & Freeman, 2002).

Diante de tal aprimoramento e de evidências de que o campo científico apresenta estratificação não somente no nível dos pesquisadores, mas também em nível institucional e regional (Rossoni & Guarido Filho, 2007), pretende-se verificar se a área de administração da informação no Brasil segue tais padrões. Como apontado anteriormente por Rossoni e Hocayen-da-Silva (2008), algumas instituições e alguns estados apresentaram concentração em termos de colaboração com os demais, apontando para a existência de uma rede do tipo centro-periferia. Portanto, diante desses argumentos, extraiu-se a proposição abaixo:

Proposição 2: A probabilidade de que um relacionamento ocorra entre pesquisadores situados em instituições e unidades federativas centrais é maior do que a de ocorrência na periferia e entre periferia e centro.

Procedimentos metodológicos

Para a realização do presente estudo, foram avaliados todos os artigos publicados da área de Administração da Informação, entre os anos de 2002 e 2006, nos anais dos Encontros Anuais da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Administração (EnANPAD)[3], totalizando 228 artigos. Vale ressaltar que o presente estudo não abrangeu os artigos publicados em revistas, o que poderia ser considerado uma limitação da pesquisa. Os autores acreditam, no entanto, que esta decisão amostral não crie nenhum tipo de viés, por dois motivos: primeiramente, como boa parte dos artigos publicados em revistas foram anteriormente apresentados em eventos, dentre os quais o EnANPAD é o de maior expressão no Brasil, a amostra ora obtida é ainda maior e mais representativa dos pesquisadores em ADI do que o conjunto de artigos contidos nas revistas científicas. Além disso, a cultura científica da área até muito recentemente não priorizava a publicação definitiva em periódicos científicos. Muitos pesquisadores se contentavam com a inclusão dos resultados de suas pesquisas nos anais dos eventos da área. Só muito recentemente, respondendo à pressão do agente de fomento à pesquisa brasileiro (CAPES), essa situação começou a mudar, embora os anais de eventos como o EnANPAD continuem a representar a instância máxima de divulgação de muitos trabalhos. 

O método de pesquisa empregado foi quantitativo, mais especificamente a análise de redes sociais, que possibilita avaliar tanto os aspectos descritivos dos relacionamentos, quanto as relações estatísticas causais de tais fenômenos (De Nooy, Mrvar & Batagelj, 2005; Scott, 2000; Wasserman & Faust, 1994). Escolheu-se utilizar o método de análise de redes sociais por incluir informações sobre o relacionamento entre as unidades de análise, atendendo ao objetivo do estudo.

Tabulação dos dados e construção das matrizes. Os dados foram tabulados com o uso do software Microsoft Excel®. Na tabulação, dois pesquisadores foram considerados conectados, se produziram artigo conjuntamente, ou seja, nos casos em que são co-autores de uma mesma publicação. Por exemplo, três artigos: artigo A, artigo B e artigo C apresentaram a seguinte configuração de co-autoria:

Artigos

Autores

Artigo A

Autor (1), (2), (6).

Artigo B

Autor (2), (3), (4), (5), (6).

Artigo C

Autor (7), (6).

Quadro 1.  Artigos e suas respectivas co-autorias.

Cada artigo apresenta n autores, sendo cada autor representado por um número. Observe-se que o autor 6 colaborou em 3 artigos (artigos A, B e C), o autor 2 em dois artigos (artigos A e B) e o restante dos autores colaborou somente em um único artigo. Elaborando-se uma rede 2-mode, ou seja, uma rede de relações entre atores e afiliações, que neste estudo corresponde à relação entre autores e artigos produzidos, ela apresentaria a configuração exposta na Figura 1. Como pode ser visto, o autor 6 apresenta laços com os três artigos, pois foi co-autor dos três. Já o autor 2 apresenta laços somente com dois artigos. Por fim, os outros autores (1, 3, 4, 5 e 7) apresentam apenas um laço cada, pois colaboraram somente em um artigo.

Figura 1. Exemplo de rede 2-mode entre artigos e autores.

Para efeitos de análise do presente estudo, a rede 2-mode (relacionamentos entre autores e artigos) foi transformada em uma rede 1-mode (rede de relações entre os autores a partir de co-autoria), ou seja, em uma matriz quadrática. Utilizando-se novamente o exemplo anterior, a rede formada pelos sete colaboradores nos três artigos apresentaria configuração semelhante à da Figura 2.

Figura 2. Exemplo de rede de colaboração entre autores.

Como se pode observar na Figura 2, o autor 6 apresenta um laço direto com todos os outros autores, portanto tal configuração indica que o autor colaborou nos três artigos. O autor 7 tem ligação direta com o autor 6 e indireta com os demais, pois colaborou diretamente somente com o autor 6. Observe que os autores 2, 3, 4, 5 e 6 apresentam laços diretos entre si por terem trabalhado juntos no artigo B. Dessa forma, foram tabulados os dados referentes ao relacionamento entre autores: a partir da colaboração na produção de artigos científicos.

Com os dados dos pesquisadores tabulados em forma de matrizes, foram criadas duas categorias de atributos: uma identificando a instituição de ensino e pesquisa à qual cada pesquisador está vinculado; e outra classificando cada pesquisador com respeito ao estado em que está situado (unidade federativa). A partir desses atributos, foram criadas mais duas matrizes por meio da técnica de blockmodels com dados categóricos. A primeira delas representa laços entre instituições a partir das relações entre pesquisadores (nível 2). Já a segunda representa laços entre pesquisadores levando em conta as unidades da federação em que as instituições às quais estão vinculados se localizam (nível 3). Por fim, outra matriz foi construída, agrupando as relações dos três níveis em somente um, com o objetivo de verificar o aninhamento das relações entre eles.

Análise dos dados. A análise de redes foi feita utilizando-se os programas UCINET 6 (Borgatti, Everett & Freeman, 2002) e PAJEK 1.23 (Batagelj & Mrvar, 2008). Primeiro, com as matrizes dicotomizadas, foi desenvolvida a análise descritiva dos dados acerca de cada um dos níveis de análise (pesquisadores, instituições e unidades da federação). No entanto, como indicam Newman (2001) e Moody (2004), os indicadores de distância média, diâmetro e coeficiente de agrupamento foram avaliados somente em relação ao componente principal[4]. Para cada um dos níveis, foram elaboradas redes de relações por meio do UCINET 6 e, para visualização das relações entre os três níveis, utilizou-se o PAJEK 1.23.

Depois da apresentação descritiva, foram avaliados o grau de externalidade e internali­dade das relações (homofilia ou heterofilia) diante da imersão dos pesquisadores em instituições e unidades da federação. Para tanto, avaliaram-se as tendências de laços entre posições (instituições e unidades da federação) por meio do algoritmo E-I Index (Krackhardt & Stern, 1998), que compara os números de laços dentro e fora das partições (Hanneman & Riddle, 2005) e possui amplitude que varia de -1 a 1. Valores positivos mais próximos de 1 indicam maior tendência de relacionamento entre atores de partições diferentes (heterofilia), enquanto valores negativos mais próximos a -1 revelam propensão dos autores de se relacionarem internamente à própria partição de que fazem parte (homofilia).

Por fim, buscou-se avaliar não somente a existência ou ausência de homofilia entre pesquisadores imersos em instituições e unidades federativas, mas a probabilidade de eles se relacionarem com indivíduos dentro e fora de suas partições. Para tanto, foi utilizada a técnica generalized blockmodels, que oferece a possibilidade de especificar os tipos de equivalência em cada bloco (De Nooy, Mrvar & Batagelj, 2005). Entre esses modelos de blockmodels, foram analisados aqueles disponíveis no UCINET 6, que avaliam dois tipos de relação: homofilia e centro-periferia. O teste, chamado network autocorrelation with categorical attributes, assemelha-se a um teste ANOVA e é baseado na densidade dentro e fora dos blocos (Borgatti, Everett & Freeman, 2002). Dessa forma, quatro modelos foram testados:

§     Homofilia constante – este modelo testa a hipótese de que autores preferem interagir com membros dentro do próprio grupo, mas assume que essas preferências são as mesmas para qualquer grupo (Borgatti, Everett & Freeman, 2002; Hanneman & Riddle, 2005).

§     Homofilia variável – este modelo é similar ao anterior, no entanto assume que cada classe de atores apresenta uma tendência diferente de homofilia (Borgatti, Everett & Freeman, 2002). Operacionalmente, o teste compara a densidade de cada célula na diagonal (classes) com todas as densidades fora dos grupos (Hanneman & Riddle, 2005).

§     Centro-periferia 1 (robusto) – tal modelo supõe que exista um centro altamente organizado (muitos laços dentro do grupo), mas, ao mesmo tempo, que existam laços em menor proporção entre os membros da periferia ou entre membros do centro com os da periferia (Hanneman & Riddle, 2005).

§     Centro-periferia 2 (flexível) – por fim, esse modelo é similar ao anterior, todavia permite que o centro apresente laços com a periferia. Assim, a periferia é, no máximo grau possível, um conjunto de casos com nenhum laço entre si (Hanneman & Riddle, 2005).

Para a realização dos testes com os modelos especificados acima, foram considerados como parâmetros de agrupamento das relações tanto os atributos das instituições de ensino e pesquisa quanto as unidades da federação em que se encontram. Assim, foi comparado o poder de explicação de cada modelo considerando o grau de condicionamento das relações entre pesquisadores, a partir da instituição a qual o pesquisador está vinculado e da unidade da federação em que está localizada.

Resultados: redes de relações em adi

Na Tabela 1 são apresentadas as estatísticas descritivas das redes de relações entre pesquisadores (nível 1), instituições de ensino e pesquisa (nível 2) e unidades da federação (nível 3) do campo de pesquisa em administração da informação no Brasil.

 

 

Nível 1

Nível 2

Nível 3

Pesquisadores

Instituições

Unid. Federativas (UF)

Unidades (n)

359

76

16

Laços

776

134

42

Média de laços por unidade

2,16

1,76

2,62

Número de componentes

87

6

2

Tamanho do componente principal

44 (12,2%)

50 (65,8%)

15 (93,8%)

Tamanho do 2° maior componente

32 (8,9%)

4 (5,3%)

0 (0,0%)

Unidades isoladas

15 (4,2%)

14 (18,4%)

1 (6,2%)

Densidade

0,6%

2,3%

17,5%

Centralização

2,8%

12,7%

41,0%

Distância média*

3,27

3,89

2,23

Distância máxima (diâmetro)*

8

8

4

Coeficiente de agrupamento*

0,800

0,350

0,378

* Cálculos efetuados sobre o componente principal.

 

 

Tabela 1. Estatística descritiva dos três níveis de relações.

O campo apresentou, entre os anos de 2002 e 2006, um total de 359 autores de trabalhos publicados nos anais do EnANPAD, cuja média de colaboração foi de 2,16 laços por pesquisador. Nota-se, também, que a área apresentou alta fragmentação: os 359 pesquisadores formaram 87 componentes independentes (conjuntos de dois ou mais partici­pan­tes), em que o maior componente representa somente 12,2% dos pesquisadores da área (44 indivíduos). Isso pode ser verificado, de forma gráfica, na Rede 1, em que os diversos componentes são representados por diferentes cores. Tal fragmentação é ressaltada se esses resultados forem compa­rados aos de outras áreas da administração, como a Administração Pública e Social (Rossoni, Hocayen-Da-Silva & Ferreira Júnior, 2008a), a Administração da Ciência e Tecnologia (Rossoni, Hocayen-Da-Silva & Ferreira Júnior, 2008b) e a área Estra­tégia em Organizações (Rossoni & Guarido Filho, 2007). Há também alguns pesquisadores isolados, num total de 15, ressaltando a fragmentação da produção científica da área.

Rede 1. Relações entre pesquisadores da área (Nível 1).

Além do componente principal, com 44 participantes, como já mencionado, há outro componente de tamanho destacado, com 32 pesquisadores, o que indica um cisma na área: há dois grandes grupos que não interagem entre si. Esses componentes aparecem nas cores azul e verde, respectivamente, na Rede 1, abaixo. Sem que precise se realizar uma análise muito detalhada, é possível perceber que o componente principal (azul) é composto por pesquisadores do Rio Grande do Sul, sendo que os seus principais representantes são professores da pós-graduação strictu senso da UFRGS. O outro grande componente (verde) congrega principalmente pesquisadores de alguma forma ligados à FGV-Eaesp, normalmente tendo sido esta a instituição em que obtiveram sua formação em pós-graduação. A facilidade com que se distingue o componente gaúcho do paulista, com conexões fortes com o Paraná e Minas Gerais já dá pistas da existência de influência da instituição de ensino em que o pesquisador atua (ou daquela onde estudou) e, talvez condicionada a essa variável, também dá pistas da unidade da federação, conforme se discutirá mais adiante.

Vale ressaltar que, apesar da fragmentação da área (muitos componentes) e da bipolarização evidenciada pela existência de dois grandes componentes, dentro dos componentes dos quais fazem parte, os pesquisadores tendem a estar estrutural­mente próximos um dos outros. Por exemplo, levando em consideração a distância média entre os pesquisadores no componente principal, é observado que eles necessitam, em média, de somente três intermediários para alcançar qualquer pesquisador dentro do próprio componente. Tal configuração das relações, alinhada ao elevado coeficiente de agrupamento[5] (0,8) indica que, apesar da fragmentação no campo como um todo, há agrupamentos que, por alguma razão, apresentam maior densidade de relações. Entre os fatores que podem explicar tal comporta­mento estão elencadas a imersão institucional e regional dos pesquisadores. Para verificar se este é o caso, analisar-se-á, a seguir, se o aninhamento em torno das instituições e das unidades federativas segue padrões de centro-periferia (Borgatti & Everett, 1999) e de homofilia (McPhearson, Smith-Lovin & Cook, 2001), sendo discutidas tais análises no tópico seguinte.

Antes de se discutir tais resultados, merece apontamento a mudança nos padrões de relacionamento que ocorrem quando são consideradas as relações entre instituições, a partir, é claro, de co-autorias. Tais relacionamentos estão ilustrados na Rede 2, cujas estatísticas descritivas estão também apresentadas na Tabela 1. Pode-se identificar um total de 76 instituições, dentre as quais 65,8% (50) fazem parte do componente principal, indicando que nesse nível, as relações são menos fragmentadas. Todavia, há um maior percentual de unidades isoladas (18,4%), demonstrando que pesquisadores de algumas instituições se abstiveram de cooperar com colegas de outras instituições. Comparando com as estatísticas do componente principal no nível dos pesquisadores, observa-se que a distância média entre instituições é maior do que entre pesquisadores, indicando que há maior distanciamento entre pesquisadores de diferentes instituições. No entanto a estrutura do componente principal do nível institucional apresentou centralização bem mais acentuada que a do componente principal no nível dos pesquisadores (12,7%, contra 2,8%), e coeficiente de agrupamento bem mais reduzido (0,350, contra 0,80). Esses dois resultados evidenciam dois padrões: 1) as instituições condicionam a busca por colaboração, demonstrando que as relações de co-autoria tendem a ser mais usuais dentro das próprias instituições; 2) os relacionamentos quando ocorrem fora da instituição não são escolhidos aleatoriamente, mas seguem algum tipo de preferência, evidenciando certo grau de hierarquização.

Rede 2. Relações entre instituições de pesquisa da área (Nível 2).

Não é nenhuma surpresa que os nós representando a FGV-Eaesp e a UFRGS sejam os mais expressivos, indicando o elevado volume de publicações creditado a pesquisadores dessas instituições. Como já era esperado, uma vez que na Rede 1 não houve nenhum trabalho conjunto de pesquisadores dessas duas instituições, não há ligação entre os nós representados pelas duas instituições. Estudos anteriores, como o realizado por Graeml et al. (2008) já haviam detectado inclusive que esta completa ausência de intercâmbio entre as duas principais instituições formadoras de pesquisadores da área no Brasil se reflete até mesmo em ligeiras distinções na estrutura intelectual da área, com os gaúchos (UFRGS) enfatizando referencial teórico europeu (principalmente francês) completamente ignorado pela instituição paulista (FGV-Eaesp), a qual prioriza a literatura norte-americana.  

Os padrões relacionais observados no nível 2 (relacionamentos entre instituições) tam­bém são observados no nível 3 (unidades da federação), mas com maior ênfase (ver Rede 3). Como visto nas estatísticas do nível das unidades da federação, a centralização chega a 41%, indicando que o condicionamento das relações em níveis de regionalidade segue uma lógica fortemente hierarquizada. No caso do campo da pesquisa em ADI, há uma concentração das rela­ções em torno de dois estados, Rio Grande do Sul e São Paulo, o que indica que os pesqui­sa­do­res da área tendem a preferir se relacionar com pesquisadores desses dois estados. Isso seguramente decorre do fato de tais estados disporem dos mais tradicionais programas de pós-graduação em administração com ênfase em Sistemas de Informação. Os ex-alunos desses programas, ao retornarem aos seus estados de origem, ou se estabelecerem profissionalmente em outras áreas, mantêm seus laços de pesquisa com os orientadores e/ou com colegas de turma, o que explica a importância destas duas unidades da federação na rede de relações apresentada na Rede 3, a seguir. Isto também leva a se imaginar, embora isto necessitasse de comprovação científica que não é possível a partir dos métodos adotados nesta pesquisa, que o fator realmente relevante para o estabelecimento das redes de colaboração científica seja a instituição. Quando se trata da instituição de formação, sua influência está relacionada aos laços de pesquisa estabelecidos com professores e colegas, que são mantidos mesmo após o pesquisador concluir seus estudos. Já quando se trata da instituição em que o pesquisador atua profissionalmente na atualidade, o fator motivador é a conveniência da proximidade. A partir destes dois pontos, a unidade da federação não representa, pelo menos aparentemente um fator relevante no condicionamento das relações.

Rede 3. Relações agrupadas por unidade federativa (Nível 3).

Os padrões de relacionamento discutidos acima reforçam a percepção da existência de mecanismos de centro-periferia (Borgatti & Everett, 1999) e de homofilia (McPhearson, Smith-Lovin & Cook, 2001), como dito anteriormente. Os relaciona­mentos entre pesquisadores não são estabelecidos somente com base no indivíduo, mas também levam em consideração a instituição a que ele está vinculado e, conseqüentemente, aspectos de localização. Ou seja, relações entre pesquisadores estão aninhadas no nível institucional e regional. As relações entre instituições, por sua vez, também estão aninhadas em nível regional. Tal proposição é ilustrada graficamente na Rede 4, em que as esferas verdes representam os pesquisadores, as azuis as instituições e as vermelhas as unidades da federação. A verificação estatística dessas relações será apresentada no tópico seguinte, com base nos blockmodels.

Rede 4. Estrutura das relações nos três níveis.

Avaliação da imersão por meio de blockmodels

Diante dos apontamentos feitos anteriormente, apresenta-se na Tabela 2 como as relações entre pesquisadores estão condicionadas pela instituição e pela unidade da federação a que pertencem. Como observado, do total de 776 laços entre os pesquisadores, 534 são internos, ou seja, ocorrem dentro da própria instituição (69% dos laços). Verificada a tendência dos pesquisadores concentrarem seus relacionamentos dentro das instituições de ensino e pesquisa em que atuam, pode-se afirmar que o local de trabalho do pesquisador leva a um padrão de homofilia, condicionando suas relações, como já apontado na literatura (McPhearson, Smith-Lovin & Cook, 2001). Se consideradas as relações no âmbito das unidades da federação, observa-se que 86% das relações (664 dos 776 laços) ocorrem dentro da mesma unidade federativa, também indicando homofilia, mas relacionada à localização geográfica.

Mesmo diante do aumento das possibilidades de interação e comunicação por meio eletrônico, o que hipoteticamente poderia diminuir as barreiras regionais, observa-se que, na área de Administração da Informação do Brasil, isto não possibilitou que a cooperação ocorresse em maior grau com pesquisadores de instituições localiza­das fora da própria unidade federativa: somente 14% das relações ocorreram com pesquisadores de outras unidades federativas.

 

Instituições

Unidades Federativas (UF)

 

Freq.

%

Densidade

Freq.

%

Densidade

Total de laços

776

100

0,006

776

100

0,006

Internos

534*

69

0,117

664*

86

0,03

Externos

242*

31

0,002

112*

14

0,001

E-I

-292*

-552*

E-I index

-0,376

 

 

-0,711

 

 

Significância

< 0,05

 

 

< 0,05

 

 

* p < 0,001

Grupos: instituições (76); unidades federativas (16)

 

 

Tabela 2. Grau de externalidade/internalidade das relações.

Os resultados acima apontam para um grau significativo de homofilia (p < 0,05), indicado pelo valor do E-I index. Como exposto anteriormente, valores negativos indicam homofilia, e, quanto mais próximos de -1, maior o condicionamento. Assim, a amplitude do resultado demonstra que a questão regional (E-I index de -0,711) condicionou os relacionamentos em maior grau do que a instituição (E-I index de -0,376). Todavia quando os laços ocorrem fora da instituição de ensino e pesquisa (242 relacionamentos), 46% destes ocorrem fora do contexto regional, indicando que aproximadamente metade dos relacionamentos interinstitucionais ocorre entre diferentes unidades federativas. Isso indica que, além de mecanismos de homofilia, aparentemente há outros fatores envolvidos na seleção das relações fora do contexto regional. Provavelmente algum mecanismo relacionado ao prestí­gio de instituições em algumas unidades federativas esteja afetando as relações, que serão avaliadas a partir da análise de padrões estruturais do tipo centro-periferia, depois de discutidos os modelos de homofilia.

Com base nos dados contidos na Tabela 3, avaliou-se a imersão na instituição e na unidade da federação, considerando que o padrão de homofilia entre os grupos é constante, ou seja, que a probabilidade de relacionamentos internos é a mesma entre os diferentes grupos. Ambos os modelos são significativos (p < 0,001), no entanto o coeficiente de explicação do modelo considerando as instituições é maior (R² = 7,6%) que o do modelo que considera as unidades da federação (R² = 2,0%). Esse resultado indica que a tendência dos pesquisadores se relacionarem com pesquisadores de outras instituições é mais constante e homogênea do que quando considerados os relacionamentos entre pesquisadores de diferentes unida­des federativas. Além do mais, a probabilidade dos laços ocorrerem dentro da própria instituição é bem maior do que dentro da mesma unidade federativa: enquanto um pesquisador apresenta um aumento de 11,5% na chance de se relacionar com um pesquisador da mesma instituição, a probabilidade dele se relacionar com um pesquisador da mesma unidade federativa aumenta somente 2,9%.

 

Instituições

Unidades Federativas (UF)

Intercept

0,001952

0,001049

In-group

0,115256*

0,029432*

0,076

0,020

Significância

< 0,001

< 0,001

 * p < 0,01

n = 128.522

 

Tabela 3. Homofilia constante.

Já considerando a homofilia como um padrão variável (Tabela 4), ou seja, que os diferentes grupos podem apresentar densidade diferente nas relações que ocorrem entre si, alguns resultados reforçam o resultado apresentado no teste anterior: de que a probabilidade dos relacionamentos ocorrerem dentro da mesma instituição e da mesma unidade federativa é muito maior do que fora (indicado pelos interceptos e coeficientes de explicação negativos). Porém, no tocante às unidades federativas, diferentemente do modelo constante, a homofilia variável apresentou um coeficiente muito maior (R² de 21,8% contra um R² de somente 2,0%). Isso indica que as unidades federativas condicionam os relacionamentos entre pesquisadores de forma muito mais heterogênea do que as instituições condicionam.

Interpretando os coeficientes do modelo exposto na Tabela 4 verifica-se que, enquanto pesquisadores da UFRGS apresentam uma probabilidade de 32% de se relacionar com pesquisadores de outra instituição, pesquisadores da UFRJ apresentam uma probabilidade de 86%. Ou seja, autores dessa última tendem a se relacionar mais comumente com pesquisadores de outras instituições (vide E-I index positivo, que reforça um padrão de externalidade nas relações). Já os estados com maior número de pesquisadores não apresentaram tendência significativa da probabilidade de laços externos, apresentando alto grau de homofilia (vide E-I index negativo). Todavia estados com menor número de relações, como o Rio Grande do Norte, apresentaram alta probabilidade de se relacionar com pesquisadores de outros estados (β = 94, p < 0,001, E-I index = 1,000), em que há uma chance em 94 de um relacionamento ocorrer entre pesquisadores desse estado.


Instituições

Unidades Federativas (UF)

 

Coeficiente

E-I Index

 

Coeficiente

E-I Index

Intercepto

-0,322093

-

Intercepto

-1,837631

UFRGS

0,323680*

-0,496

SP

1,837807

-0,725

FGV-SP

0,340484*

-0,367

RS

1,837631

-0,836

USP

0,322093*

-0,556

RJ

1,855800

-0,808

PUC-PR

0,331617 *

-0,300

PR

1,862246

-0,600

UFRJ

0,860554*

0,111

MG

1,891979

-0,838

-0,011

 

 

-0,218

 

Significância

0,006

 

 

< 0,001

 

 * p < 0,01

n = 128.522

 

 

 

 

Obs: Os coeficientes apresentam a probabilidade de que um laço ocorra fora dos grupos. Como existe um coeficiente para cada grupo, os resultados foram resumidos por questão de espaço. Foram listados apenas aqueles estados e instituições com maior número de laços na área.

Tabela 4. Homofilia variável.

Diante dos resultados apresentados até agora se pode aceitar que a proposição 1 é válida, pois identificamos padrões de homofilia em todas as análises, tanto no nível das instituições, quanto das unidades federativas. Ademais, as análises precedentes indicam que, além da homofilia, exista algum outro tipo de padrão no condicionamento, principalmente no que tange ao condicionamento em torno das unidades federativas. Sendo assim, nas Tabelas 5 e 6, é analisado o modelo do tipo centro-periferia (Borgatti & Everett, 1999) tanto para o agrupamento em instituições, quanto em unidades federativas.

 

Instituições

Unidades Federativas (UF)

Intercept

0,006038

0,006022

Core

-0,006038

0,993978*

0,000

0,003

Significância

0,998

0,006

 * p < 0,01

n = 128.522

 

Tabela 5Centro-periferia ‘strong’.

Como pode ser observado, os dois modelos relacionados à imersão institucional não apresentaram valores significativos. Já para os modelos relacionados às unidades federativas, somente o modelo “strong” foi significativo (p = 0,006), embora tenha apresentado pequeno coeficiente de explicação (R² = 0,3%). Considerando tal resultado como válido, verifica-se que, enquanto a probabilidade de ocorrência de laços entre pesquisadores de grupos periféricos é de somente 0,6%, entre grupos centrais é de 99,4%. Ou seja, como exposto na literatura (Borgatti & Everett, 1999), existe uma tendência de que nos grupos considerados centrais os relaciona­men­tos ocorram com maior freqüência e com maior facilidade do que nos grupos periféricos e do que entre grupos centrais e periféricos.

 

 

Instituições

Unidades Federativas (UF)

Intercept

0,006043

0,006074

Non-periphery

-0,000448

-0,003277

0,000

0,000

Significância

0,998

0,332

 * p < 0,01

n = 128.522

 

Tabela 6. Centro-periferia ‘relaxed’.

Mesmo tal resultado sendo significativo, vale ressaltar que o coeficiente de explicação foi pequeno, o que indica que o número de erros do modelo é elevado. Porém vale apontar que modelos do tipo centro-periferia normalmente são elaborados a partir das próprias relações, desconsiderando agrupamentos definidos a priori, e normalmente apresentam dois grupos (centro e periferia) ou três (centro, semiperiferia e periferia). Somente a especificação de grupos menores, poderia melhorar o ajuste do modelo, não sendo esse o caso neste estudo. Em suma, diante dos padrões de centro-periferia não serem significativos em três dos quatro testes, pode-se afirmar que a proposição 2 é válida somente residualmente.

Conclusões

Diante do exposto no objetivo deste artigo, analisamos como as relações entre pesquisadores da área de administração da informação no Brasil são condicionadas pela imersão institucional e regional. Diante das proposições delimitadas no quadro teórico, utilizou-se a técnica de generalized blockmodels para testar tais proposições, cujos resultados dos modelos são sintetizados na Tabela 7.

Modelos

 

Instituições

Unidades Federativas (UF)

Constant Homophily

0,076

0,020

 

Sig

< 0,001

< 0,001

Variable Homophily

-0,011

-0,218

 

Sig

0,006

< 0,001

Core/Periphery 1(strong)

0,000

0,003

 

Sig

0,998

0,006

Core/Periphery 2(relaxed)

0,000

0,000

 

Sig

0,998

0,332

n = 128.522

 

 

 

Tabela 7. Síntese dos Resultados dos Modelos Testados.

Como visto, todos os modelos relacionados ao padrão de homofilia foram significativos corroborando a proposição 1. Contudo, por um lado, o condicionamento devido à instituição foi mais homogêneo do que entre as unidades federativas, evidenciado pelo maior poder de explicação do modelo de homofilia constante para as instituições. Por outro lado, o padrão de homofilia acerca das unidades federativas foi mais heterogêneo, como apontado pelo maior poder de explicação do modelo de homofilia variável.

Existem diversos fatores que podem explicar essa diferença nos padrões de homofilia entre instituições e unidades federativas. Especula-se que, em relação à homogeneidade dos padrões frente ao vínculo institucional, uma característica peculiar – a grande maioria apresenta um programa de pós-graduação – facilite que os relacionamentos ocorram, pois normalmente os pesquisadores convivem ou conviveram no mesmo espaço, apresentam um histórico de interações e, muitas vezes, compartilham outros tipos de relações além da co-autoria como amizade, participação em grupos de pesquisa, entre outros. Já no tocante ao condiciona­mento pelas unidades federativas, acredita-se que a ocorrência da cooperação entre pesquisadores de diferentes programas, ou até de diferentes cidades, possa ficar comprometida, ocasionando maior variabilidade na continuidade da co-autoria ao longo do tempo, refletindo em variações no condicionamento.

Diferentemente do esperado, os padrões do tipo centro-periferia mostraram-se pouco significativos, corroborando a proposição 2 somente de forma residual. Dos quatro modelos testados, somente um deles referente às unidades federativas mostrou-se significativo (vide Tabela 7). Pautando-se no resultado que foi significa­tivo, verifica-se que existe algum mecanismo de seleção privilegiado por pesquisa­dores que fazem parte de algumas regiões, seja pelo acesso a recursos e informações, seja pela disponibilidade de programas mais tradicionais, seja por outras razões. Tais resultados vão ao encontro de outros estudos (Rossoni, Hocayen-Da-Silva & Ferreira Júnior, 2008a, 2008b; Rossoni & Guarido Filho, 2007), que identificaram que algumas unidades federativas tendem a se apresentar mais ‘centrais’ que outras na produção científica das mais variadas áreas.

De uma forma geral, este estudo contribuiu para a análise de redes sociais por explorar empiricamente como os atributos condicionam as relações em termos de homofilia e centro-periferia, e, de forma específica, demonstra como a cooperação no campo científico em termos de co-autoria é condicionada por questões exógenas. Neste caso a instituição e a unidade federativa demonstraram ser fatores importantes na definição dos padrões de colaboração acadêmica, o que foi operacionalizado por meio de uma técnica de análise de redes pouco utilizada, os generalized blockmodels. As implicações teóricas desse estudo remetem ao entendimento de padrões de homofilia no campo científico, cuja cooperação é vista como primordial para a qualidade das pesquisas (Acedo et al., 2006), além de contribuir para o entendimento de padrões de estratificação das relações, sob a lógica de modelos do tipo centro-periferia.

Dentre as implicações práticas do estudo, fica evidente que, se os pesquisadores quiserem estabelecer e manter relação fora de sua instituição e unidade da federação, devem estar conscientes de que o trabalho em conjunto nessas condições é menos usual, exigindo que busquem desenvolver estratégias de fomento e manutenção dessas relações. Para os programas de pós-graduação e para os órgãos de fomento, o estudo demonstra que o estímulo à cooperação interinstitucional e inter-regional, apesar de benéfica, é um desafio. Talvez por isso a Capes tenha se preocupado, em suas recentes regulamentações, em estimular as instituições a buscarem formas de os seus pesquisadores cooperarem com colegas externos, seja utilizando-se de programas de professor visitante, seja por meio de programas de doutoramento e de outras formas de pesquisa conjunta. 

Estudos futuros poderiam avaliar padrões de homofilia e de centro-periferia em outras áreas da administração, a partir da adoção de uma janela temporal, pois acredita-se que a homofilia na pesquisa científica esteja diminuindo, pelo menos em termos regionais (Wellman, 1996). Além disso, outros tipos de agrupamentos poderiam ser avaliados como, por exemplo, se há diferenças na cooperação entre professores e alunos de diferentes níveis, de diferentes cidades, pesquisadores com maior e menor grau de produtividade e prestígio na área, pesquisadores de diferentes áreas e com habilidades distintas, entre outros. Poder-se-ia avaliar, também, se a presença de outros tipos de relações como amizade, participação em grupos de pesquisa e em trabalhos em empresas aumentam a probabilidade de homofilia nas relações de co-autoria. Com um conjunto dessas informações, estudos multiníveis poderiam avaliar como as diferentes áreas da administração condicionam as diversas fontes de homofilia e de estratificação, considerando, em conjunto, as diferentes fontes de condicionamento, para evitar efeitos espúrios, contribuindo para um entendimento mais generalizado desses fenômenos.

Referências

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[1] Professor e Pesquisador do Programa de Mestrado e Doutorado da Universidade Positivo e Doutorando em Administração pela UFPR. E-mail: lrossoni@gmail.com

[2] Professor e Pesquisador do Programa de Mestrado e Doutorado da Universidade Positivo e Professor do Departamento Acadêmico de Informática da UTFPR. E-mail: agraeml@up.edu.br

* Este artigo resulta de uma agenda de estudos que integra um programa de pesquisas sobre a “Institucionalização da Pós-Graduação em Administração no Brasil”, financiado pelo PROCAD/CAPES.

[3] A Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Administração (Anpad) é a entidade científica mais relevante no campo da pesquisa em Administração do Brasil, envolvendo praticamente todos os programas de pós-graduação.

[4] Componentes são sub-redes em que os nós estão conectados entre si (De Nooy, Mrvar & Batagelj, 2005; Wasserman & Faust, 1994).

[5] O coeficiente de agrupamento, uma medida de densidade local, considera a conectividade entre atores (Watts & Strogatz, 1998), podendo variar de 0 a 1; quanto maior, mais aninhada localmente a rede está.